quarta-feira, 19 de julho de 2017

Honda CRF1000L África Twin – A roda que faltava

      
A Honda nos últimos anos decidiu concentrar todos os seus esforços nos modelos de gama baixa, acessíveis e económicos: a gama CB 500 e a NC e actualizou as VFR. Uma estratégia muito acertada em tempos de crise, mas com isso, todo o resto, gama trail e turística ficou completamente desactualizada, com o consequente desinteresse de potenciais clientes que optaram por outras marcas com ofertas muito mais actuais e interessantes.
Debruçando-nos no segmento do modelo que me leva a escrever este texto – o trail (roda 19’’ e 21’’), há que referir que a Honda está completamente desprovida. Com roda dianteira de 19’’, tem apenas a peso pesada VFR1200X CrossTourer, à qual é quase pecado chamar-lhe trail. A África Twin já foi descontinuada há mais de 10 anos , a Varadero, há uns 6 e a Transalp há mais de 3.
Neste contexto a competência tem repartida toda a cota de mercado de trails, em especial as marcas europeias BMW, KTM e Triumph, as quais têm todo o tipo de modelos com roda 19’’ e 21’’.
Assim, a Honda com a sua África Twin está a tentar recuperar algum terreno perdido, mas atacou na vertente mais radical, ou melhor, mais campestre, impondo umas dimensões completamente enduristas: roda 21” à frente e 18’’ atrás, ambas com câmaras de ar, permitindo-lhe a possibilidade de meter-lhe pneus de tacos 100% de enduro.
Posto em contacto com a moto, a verdade é que, para além do tamanho das rodas e das suspensões, todo o resto dá mais aspecto de uma moto bonacheirona, feita para todo o público, preparada para viajar comodamente com ou sem passageiro.
Considero a moto bonita, com combinações de cores muito harmoniosas, os seus componentes transmitem qualidade e têm qualidade, mas quando vejo aquela roda enorme e fininha (apenas 90 mm de espessura!) pergunto-me, para que quero uma coisa daquelas numa moto que irá andar em terra um par de vezes, e onde, ainda por cima foi privilegiado o conforto.
Posto ao volante, a posição de condução é natural e agradável, pelo menos para a minha estatura. O assento é plano e muito confortável e toda a moto transmite uma sensação de ligeireza muito grande, tanto parado, como em andamento. Uma sensação que coincide com o peso declarado, pois a versão ensaiada, sem ABS, cifra-se em 212Kg.
Os piscas em destaque
Conforme já é apanágio da Honda, as suspensões, da marca Showa, são de excelente qualidade, multi reguláveis. Em consonância com as rodas, são de longo curso: 230mm à frente e 220 mm atrás, reforçando por um lado as suas aptitudes de todo-terreno e por outro conferindo conforto em viagem. Esta característica também se nota quando travamos com alguma firmeza, afundando-se a frente da moto, mas sem perder a consistência e controlo.
O defeito de testar em muito pouco tempo uma nova moto, é que não nos adaptamos às suas particularidades. A Honda nos últimos anos tem alterado nos seus modelos os comandos dos piscas, tendo trocado a posição com a buzina. Resultado, quando por instinto queremos fazer pisca, damos uma buzinadela. Assim, fartei-me de buzinar nas rotundas, nos cruzamentos, etc. Havia necessidade de nesta altura em que está tudo uniformizado em todas as marcas, andar a baralhar coisas destas? Coisas de japoneses…
Onde a Honda tem por costume poupar muito é nos quadros, e parece que neste modelo não foi excepção. Sim, a África Twin, uma moto que custa mais de 13.000€, está dotada de um quadro de aço! Podem existir muitos e diversos argumentos, mas até nas motos de cross puseram um quadro de alumínio. Olhando para a concorrência, a Yamaha 900 Tracer por exemplo, que custa 10.000€, tem um quadro de alumínio!
A buzina, também em destaque
Também tenho que fazer uma breve referência ao quadro de bordo. No computo geral gosto dele, com o seu fundo azul escuro e dígitos brancos. É todo digital, está muito completo, com todo o tipo de informação. Acresce que tem a facilidade de dois botões na pinha esquerda, permitindo com um mudar de menu e com outro seleccionar o item desejado. Neste quadro não gostei do facto de ser todo digital, pois à distância que está, pelo menos para mim, não vejo claramente os dígitos (de dia, com sol). Ainda menos me convence o conta-rotações digital, de difícil leitura. As únicas coisas que se vêem claramente é a velocidade instantânea e a velocidade engrenada.
Por outro lado, o quadro de bordo, como está elevado em relação à posição de condução, puseram-no numa posição quase vertical, um pouco inusual, que a mim não me cai bem e se a condução se faz de pé (muito usual em todo-terreno), pior ainda. Ademais o cabo de embraiagem interfere um pouco com a sua parte de baixo (ver na foto).
Outro aspecto menos bem conseguido são os piscas da frente. Como a carenagem é bastante elevada, aí estão eles a ocupar um lugar de honra no campo de visão, tal qual as orelhas de um burro (caídas). Disseram-me que nas versões com ABS, os piscas já são em led, um bocadinho mais finos, e por isso mais discretos…
As duas primas...
Resumindo, no breve contacto que tive com a moto, parece-me ser um produto bem conseguido, de qualidade e equilibrado dinamicamente. O motor é tradicionalmente Honda, cheio de potência e binário desde baixas rotações e agradável de utilizar. O preço, 13.000€ (sem despesas), pode parecer à partida barato, mas se lhe juntarmos itens quase indispensáveis como são os punhos aquecidos, descanso central, malas, ultrapassa com facilidade os 15.000€, deixando assim de ser tão acessível. Nesta versão média, ademais do ABS, também inclui o controlo de tracção com 3 posições. Aqui também denota uma contradição – uma moto completamente direccionada para o campo com controlo de tracção? É verdade que em matéria de segurança nunca é demasiado, e como este controlo é meramente electrónico e desconectável, aceitamos o dispositivo como sendo uma prenda da Honda…
A Honda CRF1000L África Twin é uma moto que cativa ao primeiro olhar e não decepciona ao vê-la em pormenor e ao andar nela. No entanto, aqueles que são mais exigentes, notam pormenores que, não afectando a qualidade ou a dinâmica em geral, leva-nos porém a vacilar e voltar a olhar para a concorrência, onde são mais detalhistas e coerentes naquilo que disponibilizam.
Foi exactamente neste, o estado em que fiquei: a vacilar.

O problema é que quando vacilamos, acabamos por comprar outras marcas (já antes me aconteceu o mesmo), muitos mais atentos e coerentes, onde esses “maus” detalhes estão reduzidos ao mínimo e em constante melhoria.

A moto foi gentilmente cedida pela Motoboxe para "drivetest".

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